A pandemia mundial de 2020 impulsionou uma mudança significativa no modo como trabalhamos. E, o retorno ao “normal”, mostrou que estes novos modelos de trabalho vieram para ficar. Mas, esta mudança está a ser um desafio para os líderes que têm agora de lidar com diferentes modelos de trabalho, regras organizacionais e pedidos dos colaboradores, que sentem hoje diferentes necessidades.
Os modelos híbridos, remotos e flexíveis de trabalho estão a tornar-se norma no mundo de trabalho e as empresas têm de responder aos desafios que estes trazem, se querem ficar à frente da corrida na luta pelo talento, produtividade e sucesso empresarial.
Diferentes Modos De Trabalhar
Trabalhar em casa, metade em casa, metade no escritório, trabalhar às horas que quer, onde quer… Há tantos modelos diferentes de trabalho que se torna difícil definir todos os contextos laborais. E, essa falta de linhas definitivas torna difícil empregar regras e protocolos específicos dentro das empresas.
Segundo o modelo de Lynda Gratton, o modelo de trabalho que um individuo utiliza é definido por dois eixos: onde executa o trabalho (trabalha em qualquer lugar, ou trabalha no escritório) e a utilização do tempo (assíncrono, ou síncrono). Assim dentro desta ideologia, um modelo de trabalho híbrido encontra-se no campo superior esquerdo (trabalho em qualquer lugar, assíncrono). O modelo flexível encontra-se nas pontas opostas (trabalho em escritório, assíncrono ou trabalho em qualquer sítio, síncrono). E, o modelo de trabalho fixo ocupa o campo inferior direito onde trabalha no escritório em gestão síncrona do tempo.
Dentro destas designações entram ainda outras dinâmicas que devem ser consideradas quando uma equipa ou individuo contempla adotar um outro modelo de trabalho:
- Qual o trabalho e tarefas?
- Nem todos os trabalhos ou tarefas podem transpor para modelos que contemplem trabalho remoto, ou em que os colaboradores possam decidir o horário. Por exemplo, trabalhadores essenciais (supermercados, hospitais, transportadoras, etc…) veem impossível o trabalho remoto.
- Quais as preferências individuais?
- Somos mais produtivos quando trabalhamos de acordo com as nossas preferências. Enquanto muitas empresas olham agora para o trabalho remoto como a preferência, muitos colaboradores desejam voltar ao modelo presencial.
- Quais os projetos atualmente?
- Poderá haver momentos em que um trabalho totalmente remoto ou fora do horário normativo, não vai ser possível. Espaços de co-work e aluguer de salas de trabalho tiveram um aumento no negócio, com a passagem gradual ao modelo remoto de trabalho, onde ainda se sente alguma necessidade de reunir com a equipa quer por momentos de brainstorming, resolução de problemas ou trabalho em grupo.
- É justo para outros?
- A falta de justiça sobre quem pode ou não usufruir destes modelos alternativos de trabalho pode trazer uma diminuição na produtividade, burnout, redução na colaboração e irá afetar a retenção de talento que procurará outras oportunidades.
Luta Pelo Talento – O Que Exigem Os Jovens Talentos Hoje?
Hoje em dia a questão já não é quem tem o espaço de trabalho com maior design, o maior número de regalias ou as políticas mais sexy. Hoje o fator diferenciador na atração e retenção de talento é “Flexibilidade”.
A pandemia de 2020 foi a grande responsável por esta mudança, com o movimento da “Grande Demissão”, onde trabalhadores deixaram os seus empregos. E a tendência tem-se permanecido no âmbito profissional. Vários estudos apontaram para a flexibilidade como a chave do movimento. De facto, um estudo da Dimensional Reseach mostrou que 57% das pessoas considera deixar a sua empresa se tiverem de voltar ao escritório. E, um outro estudo global indicou que 54% dos trabalhadores disseram que considerariam deixar os seus empregos pós-pandemia se não receberem alguma forma de flexibilidade em relação a quando e onde trabalham.
Além disso, a Flexibilidade abre também o seu pool de talento ao abrir as portas ao mundo inteiro, e com isso proporciona a contratação de pessoas com diferentes visões e capacidades especializadas, que dará à sua empresa um avanço na competição, assegurará a produtividade completa (se alguém em Portugal fechou o dia, alguém em Vancover está a começar o dia) e irá ajudá-lo a colocar-se em novos mercados.
A nova geração de trabalhadores, foi criada com tecnologia, estando preparada para gerir todo o seu mundo – quer pessoal quer profissional – com os seus telemóveis. Estes sabem que o trabalho e a aprendizagem podem ser realizados em qualquer lugar. Mas, esta geração também vive em primeira mão as dificuldades de manter a vida pessoal e profissional separadas. Com as tecnologias inovadoras a que se habituaram desde sempre a usar, é muito fácil usar o telefone para responder emails ou enviar relatórios no meio de uma refeição entre amigos ou até mesmo antes de dormir.
Como tal, esta nova geração procura, mais do que nunca, um controlo sobre o seu tempo e dia, podendo decidir qual o horário preferido, de modo a planearem os seus momentos profissionais e pessoais. Esse controlo leva a que os colaboradores se sintam mais felizes e leais e que sejam mais produtivos.
Estes fatores e estudos mostram que a adaptação ao trabalho híbrido tornou-se um fator determinante na atração de novos talentos e espera-se que se torne uma prática padrão na maioria das organizações nos próximos anos.
Mas não é só flexibilidade que atrai o novo talento. Os novos talentos não são motivados pela ideia de simplesmente trabalhar para sobreviver. Esta geração procura propósito e prazer. A Geração Z é muito mais consciente das questões sociais. Temas como igualdade, sustentabilidade e meio ambiente são as suas principais causas.
Procuram também novos desafios e oportunidades de desenvolver continuamente as suas habilidades – algo que com o trabalho híbrido e flexível pode ocorrer, quer em modo presencial, quer virtual ou uma combinação de ambos.
E, por fim, os novos talentos procuram uma autenticidade na comunicação, com canais claros de comunicação (quer presencial, mas especialmente em modo híbrido) que definam o tom de toda a organização.
Os Diferentes Modelos De Trabalho
Que características definem os modelos de trabalho? Como os diferenciamos? E o que os distingue?
Vamos analisar 3 modelos: O modelo Híbrido, O modelo Flexível e o Modelo Fixo.
O Modelo Híbrido
O trabalho híbrido – agora mais recorrente na nossa vida profissional – é um modelo que suporta uma mistura entre trabalho no escritório e em modo remoto. Este modelo de trabalho é desenhado à volta do trabalhador, promovendo a inclusividade, engagement e o bem-estar de todos os colaboradores. A sua palavra-chave é “escolha”. Os colaboradores têm a possibilidade de escolher como trabalham.
Um estudo de Pragmatic Thinking[1] descobriu que mais de 77% das pessoas preferem um ambiente de trabalho híbrido. Quanto ao modelo de divisão de tempo, 53% das pessoas preferem uma divisão de 2 a 3 dias entre casa e escritório.
Este modelo está a tornar-se a escolha em empresas como Apple, NOS e Siemens que estão a experimentar este modelo híbrido, com configurações como 3 dias em casa, 2 dias no escritório, ou um dia no escritório para reuniões presenciais e o resto em remoto, etc.
São identificadas 4 tipos de políticas de trabalho híbrido:
- Hibrido à vontade (Hybrid at-will) – colaboradores escolhem à vontade quais os dias em que vão ao escritório.
- Híbrido semana dividida (Hybrid split-week) – a empresa define quais os dias para trabalho presencial e quais para trabalho remoto, de acordo com a equipa ou função.
- Híbrido gerido pelo gestor (Hybrid manager-scheduling) – o gestor escolhe quais os dias em que a sua equipa vai ao escritório.
- Híbrido misturado (Hybrid mix) – uma mistura de todas as outras opções.
Perante estes modelos, um estudo de Envoy, mostrou que 56% das empresas utilizam o modelo Híbrido à vontade. A política menos usada (8%) é hibrido gerido pelo gestor.
O modelo híbrido permite ainda uma maior flexibilidade nos processos de recrutamento, abrindo a porta a um mundo de talento sem importar a localização (com os avanços tecnológicos e traduções automáticas, até a limitação da língua já não é uma preocupação) e ao abrir-se a uma maior flexibilidade atrai as novas gerações que desenvolveram a sua vida profissional online.
Este modelo é claramente o preferido dos colaboradores, mas quais são os verdadeiros benefícios?
- Liberdade e flexibilidade para os indivíduos.
- Constrói uma relação de confiança com os colaboradores, o que, por sua vez, aumenta a lealdade e satisfação no trabalho,
- Aumenta a atração, retenção e adoção de talento
- Diminui os custos de gestão do escritório.
- Aumenta a colaboração e o espírito de equipa
- Melhora o clima organizacional
- Aumenta a produtividade
Para as empresas será também necessário pensar nas adaptações que podem ser necessárias executar, quer em termos de políticas empresariais, como em termos de segurança informática.
O Modelo Flexível
Trabalho flexível é um modo alternativo de organizar o horário ou o local de um dia tradicional de trabalho.
As mudanças no horário podem ser devidas a razões pessoais. Por exemplo, o colaborador necessita de modificar o horário para ir buscar o filho à creche e pede para o horário ser das 7h às 4h em vez de ser das 9 às 5h. Ou podem ser devidas a razões profissionais. Por exemplo o cliente está num outro local do mundo, e para falar com ele necessita de trabalhar no mesmo fuso horário dele.
O local também pode divergir do mesmo modo. Quer trabalhe de casa, do escritório, ou de um hotel algures no mundo, o trabalho flexível mostra estar aberto a organizar-se de modo a funcionar com todas estas questões.
Outros arranjos classificados como trabalho flexível são: horas comprimidas (por exemplo trabalhar mais umas horas a cada dia e não trabalhar na sexta), trabalho part-time, trabalho casual, job-sharing…
Mas o que torna este modelo de trabalho tão atrativo para colaboradores e empregadores? Os benefícios são claros:
- Para os empregadores:
- Aumenta a capacidade de atração, retenção e motivação de talento.
- Reduz o absentismo e presenteísmo (trabalhar sem ser produtivo)
- Aumenta a diversidade e inclusividade
- Diminui os custos de gestão do escritório
- E tem um impacto positivo no clima organizacional.
- Para os colaboradores:
- Ajuda a equilibrar e gerir as responsabilidades fora do trabalho.
- Aumenta a satisfação no trabalho.
- Traz mais energia e criatividade
- Diminui os níveis de stress.
- Aumenta a produtividade.
O Modelo Fixo
Chamamos modelo fixo aos modelos 100% - quer 100% presencial, quer 100% online. Tal como os modelos anteriores estes modelos de 100% apresentam tanto benefícios como desafios.
Consideramos o trabalho fixo presencial, como o tradicional das 9 às 17h (ou em trabalho de turnos, o turno correspondente), em que o colaborador trabalha no escritório da empresa e apresenta-se diariamente no local. Um estudo de 2022 da PWC[2], nos EUA, mostrou que 11% dos trabalhadores preferem trabalhar em período integral no escritório.
Existem inúmeros benefícios neste método, mas evidenciamos 5[3] que estão a ser sentidos por aqueles que voltam ao método presencial de trabalho:
- Colaboração casual.
- É muito fácil, reunir rapidamente a equipa necessária para resolver problemas, ou encontrar alguém no elevador que comenta sobre um problema e alguém responder com a solução.
- Comunicação abrangente.
- As ferramentas de comunicação do mundo virtual, são sem dúvida eficientes e usadas em trabalho presencial, mas não há como substituir sessões de brainstorming em que todos conversam naturalmente e escrevem ou desenham no flipchart. Até mesmo as conversas de elevador ou de café são importantes no dia-a-dia do escritório.
- Reuniões eficazes e eficientes.
- Não há problemas de ligação, câmaras congeladas ou questões de som em reuniões presenciais ou que diminui rapidamente o tempo de reunião.
- Um ambiente focado.
- Ao haver uma divisão clara de espaços entre casa e trabalho, torna-se mais fácil focar-se apenas no trabalho e não na cozinha por arrumar ou nos papéis para organizar.
- O trajeto.
- Pode parecer estranho, mas o tempo que dispensa a viajar entre casa e escritório pode ser benéfico. É durante este tempo faz a transição entre o ambiente casa e ambiente escritório e veste a sua persona de trabalhador.
Mas e aqueles que preferem o modelo 100% online? O método de trabalho fixo remoto é também um favorito entre trabalhadores. Este contempla um horário de 8h vivido de forma remota – em qualquer lado – online. Empresas como Airbnb, Dropbox e Vista estão a passar para o modelo 100% remoto[4].
Este modelo tem benefícios claros:
- Aumenta a produtividade
- Um estudo de 2 anos da Universidade Stanford, mostrou que aqueles que trabalhavam remotamente, tinham um aumento significativo da produtividade e havia menos 50% de atrito entre colaboradores. [5]
- Melhor equilíbrio entre trabalho e família
- Poupança quanto a custos de espaço de escritório
- Atração do melhor talento, mesmo além-fronteiras.
O Desafio para os líderes
A transição para novos modelos de trabalho representa um desafio para os líderes de Recursos Humanos, que desempenham um papel fundamental na tomada de decisões sobre qual modelo adotar ou modificar. Cada modelo tem as suas vantagens e desvantagens específicas, e é importante considerar como se alinham com as necessidades e objetivos da organização.
Os modelos de trabalho flexível, híbrido e fixo estão a tornar-se a norma e as empresas precisam de lidar com os desafios que cada um deles traz se quiserem manter-se à frente na competição pelo talento, produtividade e sucesso empresarial.
É essencial encontrar o equilíbrio certo entre flexibilidade e estrutura, proporcionando um ambiente de trabalho que atenda às necessidades de todos. Ao avaliar cuidadosamente as diferentes opções e as expectativas em constante evolução dos colaboradores, os profissionais de RH podem identificar a mais-valia de cada modelo e implementar mudanças eficazes.
Inês Cabral | Project Manager
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